Pra que Lei de Diretrizes Orçamentárias?

Você é um cidad@ atuante e deseja intervir para garantir recursos para determinada ação ou investimento. Como você é um sujeito bem informado, sabe que que esta demanda precisa constar da próxima lei orçamentária e, se for algo mais estratégico, no Plano Plurianual, até porque, no Brasil, todo investimento, leia-se obra, deve dele constar obrigatoriamente. Então, por que raios se preocupar com uma lei denominada de “diretrizes orçamentárias”? Aliás, será que precisa realmente se preocupar com ela?

Sem efeito vinculatório

Veja, a Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO foi introduzida, com a Constituição de 88, para o Executivo antecipar, anualmente, tanto os critérios a nortear a elaboração da lei orçamentária quanto o seu próprio conteúdo. A Constituição determinou que constassem da LDO as metas e prioridades de ação governamentais para o exercício seguinte, antes da elaboração do orçamento. Além disto, passou a exigir a explicitação prévia de modificações a ocorrerem na legislação tributária e na política de pessoal. Passados 30 anos desde a promulgação da Constituição, estes atributos da LDO, todavia, não foram regulamentados através de lei complementar, como estava previsto.

Na verdade, durante a Constituinte, ocorreu o debate sobre a instauração do regime parlamentarista no Brasil, que resultou na concepção da LDO, enquanto instrumento para permitir o possível futuro primeiro-ministro apresentar, anualmente, seu plano de governo. Como todos sabemos, a confirmação do regime parlamentarista ficou aguardando um plebiscito, realizado em 1993, que, ao contrário, confirmou o regime presidencialista e o sistema de governo republicano. A LDO, por sua vez, permaneceu inalterada no texto constitucional. Assim, para o cumprimento das determinações constitucionais, ainda que sem regulamentação, estados e municípios foram produzindo, a cada ano, leis de diretrizes orçamentárias generalistas, praticamente sem efeito vinculatório, cartas de intenção que mencionavam genericamente, por exemplo, que estavam previstas mudança na legislação tributária e na política salarial, somente para atender aos preceitos da Constituição. Na esfera federal, entretanto, devido à complexidade da agenda fiscal, naquele período de início do processo de estabilização monetária por que passava o país, a LDO cumpriu papel importante para organização do orçamento.

Populismo fiscal

É preciso lembrar que a competência legal para definir e realizar despesas, constitucionalmente, é do Executivo. Com o comando legal de exigência de definição de metas e prioridades na LDO, abriu-se formalmente o espaço para que parlamentares aprovassem a possibilidade de ações orçamentárias. No vácuo da normatização dos dispositivos constitucionais, naturalmente, isso levou a um intenso populismo por parte do Legislativo, na medida em que essas formulações dependiam efetivamente de constar da Lei do Orçamento Anual, o que não acontecia justamente por não existir formalização legal da vinculação entre o que viesse a ser aprovado na LDO com a LOA, mas geravam a imagem de uma proatividade do parlamentar não atendida pelo Executivo.

Aliás, todas as exigências constitucionais a serem atendidas pela LDO enfrentam um conflito hierárquico, na ausência de regulamentação complementar. Tanto ela quanto a lei orçamentária são leis ordinárias, o que significa que, já que a LOA sucede a LDO no tempo, suas determinações se superpõem à lei ordinária anterior. Do mesmo modo, as leis que alteram tributos, carreiras e remunerações são leis ordinárias específicas, inclusive especialmente exigidas pela Constituição como condição para as mudanças que pretendem. Assim, não há, por exemplo, como fixar um parâmetro quantitativo de aumento da alíquota na LDO, pois é necessária uma lei própria para tanto, que tem o poder de definir qualquer valor de alíquota, independentemente de uma lei anterior.

Então, veja só, você, cidadão, deste ponto de vista, a mencionada Lei de Diretrizes Orçamentárias tem pouca ou nenhuma validade para a viabilização de algum benefício. Os princípios que ela valida, de fato, seriam relevantes em um regime parlamentarista. Certamente, seus três focos, antecipação de mudanças na tributação, de metas e prioridades e mudanças na política de carreiras e remuneração dos servidores públicos possuem um valor mais amplo para a gestão dos recursos públicos, uma vez que tratam, pela ordem, da definição das condições de contribuição dos cidadãos, das finalidades alocativas em termos de resultados e do custo principal da Administração Pública. E entenda que esse comando permaneceu (e continua) vazio, favorecendo práticas populistas dos representantes parlamentares, sobretudo, nas esferas municipal e estadual, por mais de década, produzindo uma imagem distorcida das tentativas de atendimento de demandas públicas.

Instrumento da Responsabilidade Fiscal

Na verdade, em 2000, a LDO passou a ocupar lugar-chave no ciclo orçamentário. A Lei de Responsabilidade Fiscal aprovada naquele ano tornou-a seu principal instrumento de execução. O Poder Executivo passou a ter de discriminar metas fiscais e um conjunto de indicadores, que mostrem a situação e previsão de desempenho das contas públicas, no Anexo de Metas Fiscais e no Anexo de Riscos Fiscais, assim como apresentar a previsão de receitas e de renúncias fiscais juntamente com detalhes da memória e metodologia de cálculo empregadas.

Ao longo dos anos, então, a LDO consolidou-se como o momento no qual se busca garantir a responsabilidade fiscal, com destaque para a receita prevista e as metas fiscais programadas, bem como o detalhamento de critérios para possíveis contingenciamentos de despesas. Nesta perspectiva, car@ cidad@, a Lei de Diretrizes Orçamentárias serve para se buscar garantir que o Equilíbrio Orçamentário seja efetivamente alcançado. Com ela, espera-se conhecer antecipadamente qual será a receita disponível no período e se ela será suficiente para pagar as despesas programadas. Portanto, meu car@ cidad@, você deve sim se preocupar com essa lei. Ela não se destina a obrigar a execução de alguma ação pela Administração Pública, para se tentar evitar que haja déficit, ou seja, que a sua contribuição por meio do pagamento de mais impostos aconteça de forma imprevista e compulsória num período posterior.

Acontece que este tema apresenta muitas tecnalidades. Participar da reflexão sobre os critérios empregados e as estimativas formatadas demanda conhecimentos técnicos que, na maioria das vezes, nem mesmo os parlamentares detêm, mas sim a consultoria técnica do Legislativo. Então, meu car@, para o exercício desta vigilância social, esteja certo que a participação juntamente com entidades da sociais civil fará uma grande diferença, porque elas, certamente, terão condição de promover a compreensão desses tecnicismos com sua assessoria e trazer o debate para o mundo dos vivos.

Para citar esse artigo: Silberschneider, Wieland. Escola-parque, CAIC, CIAC e CEU: Origens da Educação Integral no Brasil. Estadosfera, 2019. Disponível em: http://www.estadosfera.com.br/pra-que-lei-de-diretrizes-orcamentarias/ Acesso em: xx de xxx. 20xx.

Sobre Wieland 53 Artigos
Wieland Silberschneider é Doutor em Economia e Mestre em Sociologia pela Universidade de Minas Gerais.