Orçamento da União 2020: a crise se profunda

O Governo Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional sua proposta orçamentária para 2020, dando continuidade à política neoliberal de enfrentamento da crise fiscal no país. A mídia deu ênfase ao tamanho do déficit total de R$ 124,10 bilhões, que se mantém, sem, entretanto, tratar as opções contracionistas que a proposta carrega, no cumprimento das restrições impostas pela EC 95/16. As despesas discricionárias despencam no cômputo geral do orçamento, quando consideramos 2017, ano do início da aplicação dessas medidas. Atingem as principais funções públicas de investimento como Educação, Habitação, Saneamento, Urbanização, Organização Agrária, Energia. Segurança Pública, por sua vez, cresce no período, reafirmando as opções políticas em curso. Por outro lado, as despesas com Benefícios Previdenciários continuam a crescer aceleradamente

Projeto de Lei do Orçamento Federal-PLOA para 2020 enviado pelo Governo Bolsonaro totalizou R$ 3,812 trilhões. Em relação a 2019, apresenta crescimento de 11,5%, o que, inicialmente, indica boa notícia diante de um crescimento do PIB de cerca de 0,87% e da inflação anual de 3,54%. Por sua vez, a receita primária do Governo Federal de 2019 deverá chegar a algo próximo de R$ 1,545 trilhões, enquanto o valor estimado para 2020 é de R$ 1,645 trilhões. Isso representa um aumento de 6,4%, o que continua muito abaixo do crescimento projetado do Orçamento 2020.

Esta realidade pode ser entendida a partir de dois ângulos. Em primeiro lugar, o Governo Federal continua registrando déficit estimado em R$ 118,9 bilhões, valor que, embora abaixo dos R$ 132,0 bilhões que deverá se confirmar ainda neste ano, continua maior do que os verificado em 2017 (R$ 110,594 bi) e em 2018 (R$ 108,267 bi), anos iniciais de vigência da Emenda Constitucional 95/16 que impõe o não-crescimento das despesas acima da inflação por 20 anos. Portanto, o orçamento ainda cresce mais do que a receita.

A segunda questão importante é o crescimento das despesas previdenciárias. O Orçamento da Seguridade Social-OrSS registra aumento de 13,6% superior ao do Orçamento Fiscal-OrF, 10,9%, enquanto o Orçamento de Investimentos-OrI tem crescimento de 2,5%, percentual abaixo dos 4,0% da inflação prevista no próprio Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias – PLDO para 2020. Ora, quando verificamos o desempenho em relação a 2017, primeiro ano da EC 95/16, vemos que o ritmo de crescimento nominal do OrSS desde então até o próximo ano registra a avassaladora marca avassaladora de 33,3% contra o trágico declínio do OrF de – 2,4% no mesmo período.

Aprofundando essa análise a partir das Despesas Primárias, vemos que essas devem crescer em 2020 cerca de 3,9%, portanto abaixo da inflação esperada oficialmente. Os Benefícios Previdenciários, por sua vez, estarão crescendo 7,0%, bem acima da evolução inflacionária, e as Outras Despesas Obrigatórias sobem mais, 7,6%, quase o dobro da inflação prometida. Já as despesas com Pessoal e Encargos do Governo Federal ficam abaixo do desempenho geral com 3,7% e as Despesas Discricionárias reduzem-se em devastadores -20,7%. Comparando-se com o início dos efeitos da EC 95/16, os Benefícios Previdenciários devem acumular aumento de 21,4% e Outras Despesas Obrigatórias de estrondosos 64,7%, contra o decréscimo acachapante de -64,2% das Despesas Discricionárias.

O orçamento financeiro do Governo Federal cresce mais do que a soma dos Orçamento Fiscal, da Seguridade e de Investimentos. A Receita Financeira aumentará 21,1% e a despesa correspondente, 35,3% em 2020, evidenciando os desafios de enfrentamento da crise de financiamento da economia brasileira.

Na trajetória de implementação da EC 95/16, algumas funções governamentais foram frontalmente desaceleradas. Esta desaceleração, via-de-regra, atinge finalidades não classificadas fiscalmente enquanto “obrigatórias“, porém não menos relevantes para o desenvolvimento econômico e social do país. Este é o caso de Habitação, Saneamento, Urbanização, Organização Agrária, Energia, dentre outras, funções estas que, desde 2017 até o próximo ano, deverão registrar fortes decréscimos nominais de, respectivamente, de 95,3%, 69,8%, 44,8% 34,5% e 33,3%. No cômputo do período, Educação registra uma redução de -1,9%, que, embora de menor magnitude, não menos grave, diante dos desafios desenvolvimentista do país. Já Segurança Pública eleva-se, no período analisado, expressivos 38,8%, confirmando as opções políticas em curso.

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Wieland Silberschneider é Doutor em Economia e Mestre em Sociologia pela Universidade de Minas Gerais.