Crise fiscal se aprofunda no primeiro ano do Governo Zema

Alguns mais desavisados podem chegar ao fim do ano achando que a Coronacrise foi responsável pela piora da Crise Fiscal do Estado de Minas Gerais. De fato, nenhum ente público sairá ileso neste cenário, mas a crise de Minas prosseguiu ao longo de 2019 e se aprofundou. Entramos 2020 esperando mais um déficit orçamentário de R$ 13,3 bilhões, o que corresponde, para 12 meses previstos de despesas de R$ 96, 81 bilhões, à falta de recursos para o pagamento do equivalente a um mês e meio de compromissos.

O Governador Zema assumiu o mandato demonizando a gestão anterior e afirmando que iria enfrentar a crise do Estado com o programa de recuperação fiscal, mas não conseguiu reverter ou mesmo atenuar a trajetória da desorganização das contas mineiras. Ao contrário, amplificou-a de modo geral. O passivo geral com fornecedores, empreiteiras e prestadores de serviço aumentou. Particularmente, Saúde ampliou a dívida com prestadores de serviço. Recursos para Educação atingiram o mais baixo nível dos últimos seis anos. As funções de Estado de menor participação no orçamento (tais como Cultura, Gestão Ambiental, Transporte) tiveram suas disponibilidades comprimidas ainda mais.

Até o momento, o Governo não enviou à Assembleia Legislativa projeto de lei que lhe possibilite implementar a recuperação fiscal, a qual basicamente consiste na suspensão do pagamento da dívida com a União, às custas da venda de estatais como CEMIG e COPASA, assim como deverá promover a limitação do crescimento de diversas despesas sociais. Em 2019, a iniciativa do Governo Zema foi aprovar a Lei nº 23.477, que autoriza o Estado a vender créditos a que teria direito nas operações referentes à comercialização de nióbio até 2032, no mercado financeiro, que se encontram sob a gestão da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas GeraisCODEMIG. Uma solução dramática, que, contudo, só gerará recursos para pagamento de valores equivalentes a um 13º salário do funcionalismo estadual, comprometendo a gestão de uma receita importante por mais de 10 anos!

De todo modo, diante da Crise Internacional do Coronavírus, que travou o mercado financeiro brasileiro e internacional, a operação do nióbio encontra-se inviabilizada no curto prazo. Além disto, a Coronacrise impactará profundamente o nível de atividade econômica no país e no Estado, comprometendo a receita tributária do Estado. Já se projetam perdas de R$ 7,5 bilhões na arrecadação de ICMS. A Crise Fiscal de Minas Gerais, que, certamente iria se aprofundar com a concessão do patafísico reajuste salarial para a Segurança Pública proposto e validado pelo Governo, aprovado pela Assembleia Legislativa, agora, irá se agravar ainda mais, com chances reais de atrasos de pagamentos, perante o debacle aguardado das receitas públicas por um período longo. Com isso, o déficit orçamentário deverá, neste ano, ultrapassar os R$ 20 bilhões.

Governo Zema aumenta dívida de curto prazo em 2019

Ao concluir o primeiro ano de gestão orçamentária, o Governo Zema não apresentou qualquer iniciativa de gestão que contribuísse para reter o avanço da crise fiscal. Ao contrário, aumentou, em 57,58%, a geração do montante total de Restos a PagarRAP, considerando todos os Poderes, ampliando a dívida financeira de curto prazo do Estado, e, assim, o passivo com fornecedores, prestadores de serviços, empreiteiras e aluguéis. O total acumulado de RAP em 2019 (R$R$ 28,6 bi) corresponde a 34,9% das receitas previstas naquele ano. Em 2018, esse montante (R$ 18,2 bi) correspondeu a 22,6%.

Também os demais Poderes elevaram seu passivo, com destaque para o Judiciário e Legislativo, enquanto Ministério Público melhorou sua posição. Estes Poderes aumentaram, respectivamente, em 157,7%, 137,5% e 89,7% seu saldo de RAP em 2019, basicamente porque houve desaceleração do pagamento de exercícios anteriores de Judiciário e Legislativo (75,5% e 45,9%) em relação a 2018, enquanto para o MP houve aceleração (100,9%).

Educação perde posição no orçamento para Saúde

As despesas com a gestão financeira do Estado aumentaram sua participação. A função Encargos Sociais, que engloba pagamento da dívida e transferências a municípios), respondendo por 29,0%, e Previdência Social, por 19,6%, aumentaram sua participação para quase 50,0% das despesas (48,6%), em relação a 2014= 43,2%, indicando comprometimento crescente com despesas obrigatórias.

Em seu primeiro ano, o Governo Zema reduziu os gastos com Educação para 113,9 (base 2014), ficando abaixo do patamar financeiro de 2016 (119,0) em termos nominais. Também ficaram expressivamente abaixo Ciência e Tecnologia (62,25) e Cultura (82,61). Elevou a destinação de recursos para Saúde, que, em 2019, tornou-se o segundo orçamento setorial do Estado. Passou a responder por 11,1% contra 8,8% em 2018. Educação perdeu, assim posição, passando de 11,6% no ano anterior para 10,5%. Além disso, as demais funções com menor peso orçamentário como Transporte, Ciência e Tecnologia, Gestão Ambiental e Cultura tiveram seus orçamentos reduzidos.

Educação, Legislativo e Administração fazem pagamentos abaixo de 2014

Em 2019, o Governo Zema realizou pagamentos (liquidação) superiores aos de 2018 somente no caso de Saúde, que, registrou desembolsos equivalentes ao índice de 98,85, quando tomamos o exercício de 2014 como base, contra 81,50 no ano anterior. Educação registrou 87,97 contra 93,19, menor patamar de pagamento nos últimos 6 anos. Do mesmo modo, Legislativo e Administração liquidaram despesas, respectivamente equivalentes a 92,69 e 47,82, menor nível desde 2014. Já Segurança Pública pagou 108,86 contra 115,68, abaixo do ano anterior, mas patamar ainda acima do verificado em 2014.

Quando se consideram as despesas por natureza econômica, verifica-se que os gastos liquidados com Juros e Encargos elevaram sua participação no total das despesas. Passaram de 3,8% em 2014 para 6,5% em 2019. No primeiro ano do Governo Zema cresceu 26,4%. As Despesas de Pessoal, por sua vez, cresceram positivamente 2,14%, ao contrário de 2018, quando caíram -6,83%.

Sobre Wieland 53 Artigos
Wieland Silberschneider é Doutor em Economia e Mestre em Sociologia pela Universidade de Minas Gerais.