Dep. Ulysses Gomes: incertezas e falta de transparência no PL do nióbio

Está na Assembleia Legislativa o Projeto de Lei – PL nº 1205/19 do Governador Zema destinado a permitir ao Governo de Minas a antecipação dos resultados financeiros pela Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais – CODEMIG  referente aos recebimentos pelo nióbio extraído pela Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração – CBMM, em um complexo arranjo legal que remonta aos anos 70. Os recursos seriam para o 13º do funcionalismo estadual, o que confere dramaticidade à proposição. O projeto, entretanto, é bastante evasivo, não detalhando qualquer informação capaz de esclarecer o montante a ser auferido, as condições financeiras e bancárias a serem contratadas e a quantos anos deve corresponder a antecipação desses recebíveis.

Há um conjunto de questões na sombra, envolvendo essa operação. O Governador Romeu Zema orientou a Advocacia Geral do Estado – AGE a desistir do Mandado de Segurança junto ao Tribunal de Justiça – TJ, que garantia a legalidade da cisão da CODEMIG, criando a CODEMGE, realizada em 2018. Não se sabe se, com isso, há o risco de a JUCEMG vir a cancelar o registro da CODEMGE, fazendo reverter patrimônio, contratos e despesas para dentro da CODEMIG, dificultando a visibilidade e previsibilidade do fluxo de recebíveis que se pretende securitizar e até diminuindo o valor a ser obtido na operação.  

A CODEMIG, como sócia, através de uma Sociedade em Cotas de Participação – SCP com a CBMM, não tem nenhuma ingerência na gestão do negócio de nióbio. Precisa receber da CBMM o Plano de Negócios da SCP para o período 2020/2032, do qual também não se tem notícia. Nele deverão constar as estimativas de produção, vendas, preços e custos, para fundamentar o fluxo de recursos a ser securitizado.

Além disso, o Presidente da CODEMIG e o Presidente da CBMM, em audiência na ALMG, anunciaram a realização de uma auditoria técnica dos volumes de nióbio extraído das minas. Com o resultado dessa auditoria espera-se ter mais elementos para para avaliação das incertezas nesse processo. Até agora, porém, o resultado da auditoria não foi tornado público.

Há também indagações sobre o contrato já firmado pela CODEMGE com a consultoria da Rothschild por R$ 14 milhões antes mesmo da autorização legislativa. Não se sabe se existe cláusula de ressarcimento, caso a operação não se realize.

Por fim, cabe um posicionamento do Tribunal de Contas em relação à natureza da operação pretendida. A Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia entendeu que a operação pretendida pelo Estado junto à CODEMIG não seria operação de crédito, mas sim alienação de ativo. Embora o PL 1205/19 seja bastante genérico, depreende-se que não haverá efetivamente alienação de patrimônio, mas sim antecipação de renda futura. Isso não configuraria, de fato, operação de crédito por Antecipação de Receita – ARO, vedada legalmente?

A seguir, o Deputado Ulysses Gomes, que está participando ativamente da tramitação do projeto sobre os recebíveis do nióbio, analisa questões relevantes para compreensão do tema.

Deputado Ulysses Gomes

Desde o início deste ano, a Comissão de Minas e Energia trouxe para o Legislativo a discussão sobre a exploração do nióbio realizado pela Companhia Mineradora do Pirocloro de Araxá – COMIPA, considerando o conflito de interesses entre os sócios público e privado – CODEMIG e Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração – CBMM respectivamente, manifesto após o resultado da Auditoria de Recursos Minerais do Depósito de Nióbio em Araxá realizado pela SRK Consultores do Brasil Ltda.

Neste processo de discussão veio a público problemas graves relacionados ao gerenciamento desta sociedade ficando demonstrada a completa submissão da COMIPA à CBMM, a falta de transparência nas informações prestadas pelo gestor privado, além do real desequilíbrio no volume de minério extraído e, consequentemente, na partição dos lucros em prejuízo da CODEMIG.

Esgotada a discussão no âmbito do Legislativo, encaminhamos todas estas informações coletadas ao Ministério Público de ContasMPC para as devidas providências a fim de proceder ao controle externo desta atividade que se mostravam lesivas ao erário.

Em reunião realizada com as procuradoras do MPC responsáveis pela causa, com a presença do atual presidente da CODEMIG, recebemos deste, a informação da efetivação do contrato para a realização da perícia técnica especializada para reconstituição das minas de nióbio de forma a identificar o volume explorado em cada mina através dos anos e assim comprovar, ou não, as suspeitas de irregularidades na lavra paritária do nióbio, conforme determina o Estatuto da COMIPA. Informou ainda, que a empresa contratada pediu o prazo de 60 dias para conclusão dos trabalhos, prazo este que se esgota neste mês de novembro. Não temos conhecimento do resultado desta auditoria, informação que consideramos fundamental para que se possa determinar o verdadeiro fluxo de dividendos que se pretende securitizar. Foi, portanto, com conhecimento de causa das incertezas que ainda persistem nos resultados obtidos pelo Estado na exploração do nióbio de Araxá, que me levaram a buscar as informações que considero imprescindíveis para avaliar uma operação de tal importância.

O Projeto de Lei foi enviado a esta Casa sem nenhuma informação, estudo ou documentação quanto à estruturação da operação que se pretende fazer para captação de recursos junto ao mercado financeiro.

Acrescente-se a isto o fato do Projeto de Lei ter sido enviado a esta Casa sem nenhuma informação, estudo ou documentação quanto à estruturação da operação que se pretende fazer para captação de recursos junto ao mercado financeiro, (i) quanto a taxa esperada para captação dos recursos e o spread estimado para a operação, (ii) fluxo de caixa futuro dos recebíveis da CODEMIG, baseado no plano de extração do nióbio no estudo de variação do preço futuro. Sequer é informado o valor mínimo aceitável da operação.

Outra preocupação que não pode passar despercebida pelo Legislativo se refere aos impactos desta operação nos serviços prestados pela CODEMGE, empresa pública responsável e reconhecida como importante indutora do desenvolvimento de Minas Gerais, em parceria com o setor privado, que tem como principal fonte de receitas os repasses mensais, a título de dividendos, feitos pela CODEMIG.

Devido a tantas incertezas e da absoluta falta de transparência que, até o momento, envolve esta transação, tomei a iniciativa, em conjunto com o presidente da Comissão de Administração Pública, Deputado João Magalhães, de propor audiência pública com a presença do vice-presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Dr. José Alves Viana, relator da Representação Nº 1.040.662, pela qual se requer a determinação de diligência a fim de proceder o controle externo dos procedimentos que o Estado de Minas Gerais já está adotando para antecipação dos recursos do nióbio e venda da CODEMIG, das procuradoras do Ministério Público de Contas, Dra. Maria Cecília Borges e Dra. Sara Meinberg, signatárias do pedido de diligência junto ao Tribunal de Contas do Estado – TCE, do Advogado-Geral do Estado, Dr. Sérgio Pessoa de Castro e do presidente da CODEMIG, Dr. Dante Matos, como forma de obter estas informações que considero imprescindíveis para que este Legislativo possa avaliar e decidir com transparência, objetividade e responsabilidade sobre esta operação. Convidamos também, para contribuir para o aprofundamento desta discussão e como representante da sociedade civil, a Dra Maria Lucia Fatorelli da Auditoria Cidadã, que vem estudando e questionando a falta de informações sobre este processo.

Reconheço o desequilíbrio financeiro por que passa o Estado de Minas Gerais e as reais dificuldades de cumprir seus compromissos, inclusive e, principalmente, os referentes ao pagamento do 13º e regularização do salário do funcionalismo e tenho a convicção de que as medidas agora propostas irão gerar a necessária segurança jurídica ao procedimento.

Não só reconheço, como muito me preocupa, o desequilíbrio financeiro por que passa o Estado de Minas Gerais e as reais dificuldades de cumprir seus compromissos, inclusive e, principalmente, os referentes ao pagamento do 13º e regularização do salário do funcionalismo e tenho a convicção de que as medidas agora propostas irão gerar a necessária segurança jurídica ao procedimento, evitando percalços de uma possível judicialização como ocorrido no passado recente, e que se não houvesse ocorrido, não teríamos o nosso funcionalismo público nesta situação.

Não sou daqueles que defendem a tese de que um fim nobre justifique quaisquer meios, principalmente quando se trata de colocar em risco o patrimônio público e entendo que esclarecidas todas estas dúvidas, acho válida e justa a aprovação desta operação como forma de amenizar o desequilíbrio fiscal.

Sobre Ulysses Gomes de Oliveira Neto 1 Artigo
Deputado Estadual pela 3ª Legislatura. É gestor e administrador público, graduado em Administração Pública e formado em Metalurgia pelo SENAI. Foi vereador em Itajubá de 2002 a 2004 e chefe do gabinete do deputado federal Odair Cunha, em Brasília, a partir de 2005.